[Esperança, quadro de Gustav Klimtque se encontra no MoMA - Museum of Modern Art of New York] * * Nestes últimos vinte anos nada de novo há, no rugir das tempestades. Não estamos alegres, é certo, mas também porque razão haveríamos de ficar tristes? o mar da história é agitado. As ameaças e as guerras, havemos de atravessá-las, rompê-las ao meio, cortando-as como uma quilha corta as ondas.
abaixo da linha do equador * estamos no fim do ano, e não posso me esquivar de uma lista básica. das coisas que faz a vida ter mais graça: música, cinema, a cidade e os queridos seres que dão cor e movem minha vidinha. segue, então, uma pequena lista, completamente pessoal e subjetiva, sem critérios, nem hierarquias... * *
fazer o clipe Costa Rica, do grupo de hip-hop Costa a Costa, foi o melhor de 2007: o resultado agradou a gregos e baianos. e foram três dias de trabalho e entusiasmo, em companhia dessa gente linda, elegante e sincera, percorrendo os espaços maravilhosos da cidade, em lugares que nos espantam e fazem de qualquer feliz roteiro uma feliz realização, que se re-escreve numa paisagem naturalmente generosa, que dispensa qualquer efeito especial... essa luz que se derrama sobre nós, sobreviventes do céu e inferno, que fica bem abaixo da linha do equador. * gente é prá ser feliz... para os amigos e parceiros, que fizeram acontecer encontros bacanas em 2007, de trocas afetivas e de trabalho, desejo que as afinidades que nos unem, sejam cada vez mais radical e esteticamente eletivas, em todo o resto de nossas existências. são vocês, mais que especiais, deliciosos interlocutores da vida que pulsa debaixo da linha do equador: Valdo Siqueira (não suporto viver longe dele), Leonardo (cúmplice de todas as horas), Ricardo (sem ele, a rotina dos dias não tem requinte, nem humor), Alexander (parece que nos conhecemos faz um século), Don L. (parceiro querido e amigo) + Nego Gallo, Flip Jay, Junior D. e Preto B (o jogo é de vocês, “tão ligados”?), Natália (doce bailarina de imagens), Paulo (sem suas aflições, tudo fica monocromático), Philipi (falta tempo para tanta boa conversa), Valentino (o mais destemido, um caso irrecusável de adoção), Bruno (que suporta as dores do mundo e esquece as suas), Lídia (nêga maluca e especial), Gabriel (comentarista precioso) Luís (uma figura sólida e essencial), Bia e as Danieles (em silêncio, elas já falam demais), Helder (quem nos conduz, tranqüilamente). * * * Divas
Amy Winehouse e Mari (Chambao) nesses clipes geniais.
* confesso minha atração pelas narrativas não-lineares. na vida e na arte. afinal, nossas vidas são narrativas em linhas desordenadas, onde personagens e fatos seguem, conexos, desconexos, com trilhas sonoras e eventos que ora nos surpreendem, nos alegram, nos entediam ou nos aterrorizam. confesso também minha atração pela obra de David Lynch. vi tudo, dos episódios da cult série televisiva “Twin Peaks” até mesmo o filme trash “Encaixotando Helena”. uma coisa que atrai em Lynch é que ele costumar dar nocautes nos espectadores, no primeiro ou no último da fila. no especialista ou no mais desavisado. Lynch faz o que quer no cinema e deixa suas marcas em boas narrativas fílmicas. "Inland empire" título original, traduzido aqui por "Império dos sonhos" é sim um tenso e angustiante pesadelo vivido pela atriz Laura Dern (outra diva) que necessita da participação, ou familiaridade do espectador com a linguagem do diretor - para montar o mundo em que a protagonista se encontra presa, um mundo de terror. à medida que é possível juntar os fragmentos dessa narrativa, qualquer um pode sentir falta de um manual para sobreviver ao filme... mas também, é possível montar o quebra-cabeças que de modo geral, me parece, conter fragmentos de toda a obra do diretor. ou de outro modo, seguir as pistas e desvendar essa história descontínua, plena de códigos quase inteligíveis, também clichês, mistérios e estranhas obsessões: esse o submundo de Lynch. mas também de qualquer pessoa comum. sim, cinema-arte, sem concessões. e adoro isso. * * * bem vindos ao dessert do Natal! em 2008 que se cumpram as promessas de felicidade.
hoje acordei cedo. sempre acordo cedo, maldito despertar de minha consciência. meus olhos, vermelhos, insistem em abrir, resisto. viro pro lado, pro outro. ainda é escuro lá fora e esse vento atravessa o quarto. meus olhos abrem e observam a desordem espalhada no quarto, em imagens que chegam lentamente com o amanhecer.tenho muito prá fazer no dia, levanto então. faço um café, e depois um cigarro.hoje acordei com o mundo me consumindo...
* * beaucoup de poèmes pourraient décrire mon affection pour toi. mais je n'écris pas de poèmes... je peux seulement dire ce qui reste ici, les significations de nos conversations sobres et presque ivres aussi, sensibles et parfois très tranquilles. à un passé rapide les jours que nous vivons joints, mais ils me paraissent comme un siècle... j'attends encore qui peuvent suspendre le temps entre nous, et rire à près des choses amusantes, écouter beaucoup de bonnes musiciennes, faire de nouveaux trajets dans les autres villes, parler quelque chose d'une philosophie mondaine, prendre une bière glacée, danser un samba, regarder des images de l'enfance, et peut-être gagner cette distance qui nous sépare... * * the divine image
to mercy, pity, peace, and love all pray in their distress; and to these virtues of delight return their thankfulness.
for mercy, pity, peace, and love is god, our father dear, and mercy, pity, peace, and love is man, his child and care.
for mercy has a human heart, pity a human face, and love, the human form divine, and peace, the human dress.
then every man, of every clime, that prays in his distress, prays to the human form divine, love, mercy, pity, peace.
and all must love the human form, in heathen, turk, or jew; where mercy, love, and pity dwell there god is dwelling too.
O mundo estava no rosto da amada - e logo converteu-se em nada, em mundo fora do alcance, mundo-além.
Por que não o bebi quando o encontrei no rosto amado, um mundo à mão, ali, aroma em minha boca, eu só seu rei?
Ah, eu bebi. Com que sede eu bebi. Mas eu também estava pleno de mundo e, bebendo, eu mesmo transbordei.
Rainer Maria Rilke, Tradução: Augusto de Campos.
* * *
"Ah, mas que significam os versos, quando os escrevemos cedo! Devia-se esperar e acumular sentido e doçura durante toda a vida e se possível durante uma longa vida, e então, só no fim, talvez se pudessem escrever dez versos que fossem bons. Porque os versos não são, como as gentes pensam, sentimentos (esses têm-se cedo bastante), – são experiências. Por amor de um verso têm que se ver muitas cidades, homens e coisas, têm que se conhecer os animais, tem que se sentir como as aves voam e que se saber o gesto com que as flores se abrem pela manhã. É preciso poder tornar a pensar em caminhos em regiões desconhecidas, em encontros inesperados e despedidas que se viram vir de longe, – em dias de infância ainda não esclarecidos, nos pais que tivemos que magoar quando nos traziam uma alegria e nós não a compreendemos (era uma alegria para outro -), em doenças de infância que começam de maneira tão estranha com tantas transformações profundas e graves, em dias passados em quartos calmos e recolhidos e em manhãs à beira-mar, no próprio mar, em mares, em noites de viagem que passaram sussurrando alto e voaram com todos os astros, - e ainda não é bastante poder pensar em tudo isto. É preciso ter recordações de muitas noites de amor, das quais nenhuma foi igual a outra, de gritos de mulheres no parto e de parturientes leves, brancas e adormecidas que se fecham. Mas também é preciso ter estado ao pé de moribundos, ter ficado sentado ao pé de mortos no quarto com a janela aberta e os ruídos que vinham por acessos. E também não é ainda bastante ter recordações. É preciso saber esquecê-las quando são muitas, e é preciso ter a grande paciência de esperar que elas regressem. Pois as recordações mesmas ainda não são o que é preciso. Só quando elas se fazem sangue em nós, olhar e gesto, quando já não têm nome e já não se distinguem de nós mesmos, só então é que pode acontecer que, numa hora muito rara, do meio delas se erga a primeira palavra de um verso e saia delas".
Rainer Maria Rilke in Os Cadernos de Malte Laurids Brigge, tradução de Paulo Quintela
[los secretos del corazón humano son a veces tan profundos que no se pueden penetrar fácilmente; por esta razón, los mejores momentos de un amor son aquellos en que te asalta una serena y dulce melancolía; cuando lloras y no sabes por qué; cuando reposadamente te resignas ante una desventura sin saber cuál es; cuando gozas con una nadería y sonríes con menos todavía...] Giacomo Leopardi
... os séculos a se passarem lá fora e aqui escuto um poema de Leopardi, lido com um assombroso lirismo romântico. fico absorta em teus olhos amarelos de leopardo, entre um profundo silêncio que separa a gente e um vento suave, que entra pela janela e faz sossegar a febre de minha alma.
¨[praia do futuro,domingo 21/10/07, by Simone Lima]
GÊMEOS De 21/05 a 20/06 “Procure divertimentos mais tranqüilos nos próximos dias. Ler um bom livro, ver um bom filme e jogar jogo da velha trarão a você uma satisfação impar. Se tentar fazer qualquer outra coisa, como ir na padaria, sofrerá um acidente terrível e perderá os movimentos do lado esquerdo do corpo. Espere... Esse é o horóscopo de gêmeos? Ah, não, para você o destino reservou um seqüestro relâmpago seguido de morte lenta lentíssima!.”
Esses dias li uma antologia de paródias de auto-ajuda. “35 segredos para chegar a lugar nenhum”, organizado por Ivana Arruda Leite. São 35 escritores em paródias impagáveis. Essa previsão do signo de gêmeos é uma amostra do “Horóscopo Terrorista”, do guapíssimo Santiago Nazarian. Contrariando as previsões, nesse sábado último, ao som dos ventos de outubro e depois de degustar algo, tomar um rioja, fui ao Dragão do Mar, encontrar um amigo e acabamos flanando por ali, até mais tarde. Entramos num bar cubano, e suportamos vinte minutos de um flash back dos anos 70 anestesiados pelas bizarrices na pista. mas logo dali saímos e numa rua escura, coberta por uma névoa de gente, bebida e sons dispersos, numa rota de colisão, te encontrei. Estranho, pois nesses dias, estavas presente como nunca... de volta, já no alfalto, assisti um outro flash back, a morte lentíssima de nós dois... entre carros, luzes, árvores e deslocamentos “os nossos pés a caminhar pelo passeio, o sangue dentro de nós a lubrificar os nossos corações, os séculos a passarem...”
ontem parecia que o inverno era o nosso tempo. mas nessas latitudes sempre é verão. então a promessa de vinho e fondue no frio que se anunciava fica adiada. pois o tempo do inverno aqui é algo improvisado, sempre superado pelo afobamento da rua, pelo calor que se solta dos corpos. hoje, com esse sol se derramando pela praia do futuro, aonde o mar invade a aparente lassidão do domingo, melhor mergulhar, mesmo sem bote salva-vidas, e admitir, que voltar ao mar é condição fundamental para ser feliz.
. . Com ou sem religião, as pessoas bem-intencionadas farão o bem e as pessoas mal-intencionadas farão o mal; mas, para que as pessoas bem-intencionadas façam o mal, é preciso religião. . . Steven Weinberg, físico norte-americano, nobel de física, espantado com alguma coisa. . .
Sofia Coppola, em Maria Antonieta, atesta que podemos, e devemos, quebrar imagens. A diretora abandona o contexto político do século XVIII e a versão da história oficial que vê na rainha a faísca que causou a Revolução Francesa e prefere falar da vida de uma jovem, aprisionada na corte que, em sua condição de adolescente, segue descobrindo a vida, vislumbrado a liberdade da alma. Uma jovem com todas as determinações de sua época, que assume o papel de mulher, mãe, e carrega, ao mesmo tempo, missão, culpa, tristeza, frivolidade e poesia comuns à corte de Maria Antonieta, mas também banal a qualquer época. Essencialmente, rompe com a imagem, comum à filmografia da história da revolução francesa, de uma corte apenas cheia de perversidade. A trilha sonora, pérolas da angústia juvenil dos anos 70, 80, e 90, nos faz viajar nos contrastes dos tempos, e saber que estamos, sim, diante de uma livre leitura da história e seus personagens. Um recorte possível e ousado, destituído de suas versões em linha reta ou biografia autorizada, essa história da rainha soma-se às narrativas visuais contemporâneas, clipada, sem pudor e pretensões e nos faz sorrir e cantar.
Marie Antoniette: Estados Unidos/Japão/França, 2006 Roteiro e Direção: Sofia Coppola.
>perdemos a noção da temperatura. mas hoje o sol me deixou confortável para saber que depois dos excessos, vem o silêncio, e logo um certo caos. para tentar pôr ordem, sigo uma pista, a BR116, sem lugar de chegada. play uma música indie, meu espírito assim exige. percorrer, por percorrer. sem sina e nem tolerância para companhia. perder-se no tempo, nesse espaço marcado de linhas quase retas. acelero ou sigo mais lentamente, conforme a música. tenho um interesse fora do comum por histórias absolutamente ordinárias, com finais felizes e um longo beijo antes dos créditos finais. mas hoje estou indolente, e confesso, meu tempo com você estourou. beibe, pare de me seguir. quero ir nessa contramão, sem me importar se é noite, se chove, ou se é dia lá fora.
nesses dias santos, andei por ruas, subi e desci ladeiras, entrei em alguns templos, divinos e profanos. vi e ouvi o novo trabalho de Ry Cooder, que é um disco, um livro de histórias infantis, uma declaração política, com canções americanas de protesto popular. tentei ler sobre minha aldeia, um romance escrito nos idos dos anos 1920, mas fiquei ali pela introdução. estive arredia à mídia, exílio voluntário. observei uma cidade, conectada-desconectada do mundo, uma babel, Macondo, Coccoci. um lugar, no Cariri, de gente, idiomas, climas e sinais, que a tudo contém, mas que também padece – assim os humanos em espera de absolvição, nesses dias santos. também olhei do alto, o céu, com olhos azul-turqueza, talvez a cor da fé. do alto, sempre planam dúvidas. como é frágil o coração que tenta traduzir sentimentos, artifícios, lugares, juntar pedaços desse antigo-novo mundo, e ora se alegra, ora se lamenta, nesses momentos de fuga.
Robert Altman, em Short curtes (1993) e Milcho Manchevski, em Before the rain (1994) iniciam uma maneira de se construir uma narrativa fílmica: são crônicas com o acaso cruzando pessoas em dramas cotidianos. O genial dessa narrativa fica por conta da mudança de cena quando o desespero já envolve o espectador, cada história fica suspensa no tempo, se intercala e se conecta, até chegar cada uma a sua resolução final. Com essa narrativa Alejandro González Iñárritu vem criando sua filmografia, desde Amores Brutos, 21 Gramas e recentemente em Babel.
Tudo está em contato com tudo, o mundo conectado, desconectado, o enredo de Babel. São situações exasperantes da convivência humana, em tempos e lugares distintos, unidas pelo trágico desfecho de um acidente, num ciclo que exibe os contrastes culturais entre Marrocos, México, Estados Unidos e Japão. O filme começa no Marrocos, um pobre criador de cabras dá a seus filhos uma arma para espantar os chacais do seu rebanho. Porém, o estrago de um disparo será o ponto de ligação das histórias. Ali, uma mulher americana, em excussão com seu marido, é atingida pelo tiro; os filhos do casal, sob os cuidados de uma babá mexicana, vivem uma situação-limite entre a fronteira de Los Angeles e Tijuana; em Tóquio, os dilemas de uma garota surda-muda e órfã de mãe, que vive com o pai, o homem que deu de presente a arma ao pastor marroquino. O episódio do Japão fica meio à parte, trata-se de um filme que se desprega dos outros: maior densidade para os conflitos de uma adolescente japonesa que se comunica com o mundo a partir de aparelhos de última geração, mas que têm em sua deficiência física e relação com o pai os impedimentos de sua liberdade sexual. Uma história que não segue o fio dramático das outras, ligando-se a elas de modo forçado. Talvez o diretor busque em Babel nos sensibilizar para a idéia de unificação fraterna entre os povos, o respeito às diferenças, expondo que esta fraternidade universal está condenada pelo egoísmo dos americanos, intolerância dos franceses, miséria marroquina, subserviência mexicana, ou solidão dos japoneses, inscritas no filme, mas também comuns a diversos povos espalhados em lugares inóspitos ou super populosos do mundo. Sem pretender estigmatizar, essencialmente o filme aponta ser esse o sentido das (des) conexões de um mundo em descontrole. Tema que pode render muitos filmes ou conversas. A direção e fotografias são maravilhosas - as imagens no Japão, impagáveis! - fazem bailar qualquer apreciador da sétima arte.
Babel, EUA, 2006, 142 min. Drama. Dir. Alejandro Gonzáles Iñárritu.
O filósofo, sociólogo e crítico da cultura francês, Jean Baudrillard, 77 anos, morreu no dia 7 de março, em Paris. Baudrillard iniciou sua carreira traduzindo Karl Marx, Bertold Brecht e Peter Weiss. Ficou conhecido mundialmente por sua crítica à sociedade de consumo, e por sua filosofia fundamentada no conceito de virtualidade do mundo aparente - teorias do simulacro e hiper-realidade.
Para Baudrillard a realidade é um simulacro, uma criação espetacular dos meios tecnológicos de comunicação. O simulacro não oculta a verdade, ele é a verdade. O espetáculo é crucial para criarmos visões do mundo. A autenticidade das coisas mundanas é crescentemente substituída pela cópia, pela reprodução, pela simulação. Assim, o mundo se define por um processo de desmaterialização do real. O homem moderno, extasiado, desvincula-se, crescentemente da natureza e de seu meio social, e dirige seu olhar às mensagens midiáticas que, excessivas, dificultam a busca de sentido.
Tornou-se célebre por suas polêmicas, sobre a arte - a arte contemporânea é uma nulidade; a Guerra do Golfo - a guerra não aconteceu, ela foi uma simulação da TV. Ou também, sobre os ataques de 11 de setembro – uma mescla de hiper-realidade, simbolismos e fantasias tenebrosas, resultado de nossos desejos: “o terrorismo é imoral e responde a uma globalização que também é imoral.” Sua crítica, corajosa e lúcida, nos faz pensar sobre as inúmeras máscaras da sociedade contemporânea.
As fotografias de Celso Oliveira, presentes na exposição Reflexões,aberta nesse 08 de março, ocupam os espaços do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura: as salas fechadas, e os espaços abertos - passarelas, arcadas, paredes. Foram selecionadas e ampliadas 70 imagens já publicadas nos livros A Corte vai passar - um olhar sobre o carnaval de Pernambuco; Brasil Bom de Bola; Mar de Luz - litoral do Ceará; Fortaleza 27º e Brasil Sem Fronteiras.
As imagens de Celso, visceralidade poética, múltipla e humana, nos faz percorrer a religiosidade e cultura popular, praias, sertões nordestino e outras incursões visuais pelo mundo afora...
Visitações de terça a domingo: Centro Cultural Dragão do Mar de Arte e Cultura. Mais informações, (85) 3488.8611 .
A expressão down and out - utilizada no boxe quando o jogador é nocauteado e não se levanta – define a situação vivenciada por um jovem escritor e jornalista inglês, em Paris e Londres, no final da década de 1920. Traduzido como Na pior em Paris e Londres o livro de estréia de George Orwell, pseudônimo de Eric Arthur Blair, trata-se das observações da condição humana na pobreza, quando o curso da revolução industrial afinava as regras do jogo e dividia irremediavelmente o mundo entre pobres e ricos Down and out em Paris e Londres foi recusado pelas Editoras Jonathan Cape, Faber & Faber – mesmo recomendado por T.S.Eliot, e seria publicado, em 1932, pelo editor Victor Gollancz – padrinho literário de Ford Madox Ford, desde que suprimidos os nomes, palavrões e passagens inteiras. O relato de Orwell sobre o mundo do lúmpen de Paris e Londres, inaugura, segundo pósfacio de Sérgio Augusto, um tipo de jornalismo literário “que podemos chamar de existencial – e que nada mais é do que uma grande reportagem escrita e plenamente vivida na primeira pessoa.” Em Paris, Orwell aportou na primavera de 1928, em busca de um lugar barato para se iniciar como escritor. No entanto, sem dinheiro, se instalou no Quartier Latin, num hotel de quinta, numa rua com “casas altas e leprosas” e viveu a condição de desempregado e depois lavador de pratos (plongeur) de um hotel de luxo. Sua descrição sobre as péssimas condições de trabalho na cozinha do hotel é desalentadora: “quanto mais se paga pela comida, mais suor e cuspe se é obrigado a engolir”(...) – a narrativa é atravessada pela voz de seus companheiros migrantes, que com suas histórias intrigantes, engraçadas, trágicas, sobre viciados, homossexuais, ladrões e chantagistas, revelam situações de sobrevivência de seres a deriva, que perderam definitivamente sua humanidade. De Paris seguiu para Londres em 1929, atraído por uma promessa de emprego que não vingou. Passando a perambular sem dinheiro, lança olhares sobre as diferenças das cidades e sente falta do ar febril, da vida ruidosa dos becos e das praças de Paris. Os parques de Londres não ofereciam nem mesmo bancos aos mendigos, era preciso pagar para se sentar. O relato da mendicância é espantoso: as condições dos albergues, a sobrevida de milhares de pessoas garantida pelo estado. Nos capítulos finais o relato ganha aspecto acadêmico, traz uma espécie de glossário sobre as gírias e os palavrões londrinos utilizados à época; dados oficiais dos sem-tetos espalhados nos albergues; a classificação de ideais tipos de mendigos; uma categorização dos tipos de acomodações, apreciações gerais sobre a Lei da mendicância e um rol de sugestões para melhorar a condição dos mendigos. Orwell recomenda ao leitor ler esse “mundo que o espera, se alguma vez você ficar sem dinheiro” como uma história banal, “um diário de viagem”. Uma viagem bem contada. Mais que uma obra de jornalismo literário, esse livro é um relato antropológico sobre a alma das ruas das duas metrópoles e também lições práticas, que no fazem descobrir com o autor que a pobreza tem seu lado redentor: “ela aniquila o futuro.”
George Orwell. Na pior em Paris e Londres São Paulo: Companhia das Letras,2006 (255 pgs)
Esses dias terminei a leitura de Contos Fantásticos do Século XIX, organizado por Ítalo Calvino. A narrativa fantástica, nos diz Calvino nasce no terreno da filosofia dos séculos XVIII e XIX. E seu tema é, pois, “a relação entre a realidade do mundo que habitamos e conhecemos por meio da percepção e a realidade do mundo do pensamento que mora em nós e nos comanda.” No prefácio uma distinção entre o fantástico e o maravilhoso: Todorov, em sua Introduction à la littérature fantastique (1970), afirma que aquilo que distingue o “fantástico” narrativo é precisamente uma perplexidade diante de um fato inacreditável, uma hesitação entre uma explicação racional e realista e o acatamento do sobrenatural. Entretando, a personagem do incrédulo positivista que aparece freqüentemente neste tipo de narrativa, vista com piedade e sarcasmo porque deve render-se ao que não sabe explicar, nunca é contestada em profundidade. De acordo com Todorov, o fato extraordinário que o conto narra deve deixar sempre uma possibilidade de explicação racional, ainda que seja a da alucinação ou do sonho (boa tampa para todas as panelas). Já o “maravilhoso”, também conforme Todorov, se distingue do “fantástico” na medida em que se pressupõe a aceitação do inverossímel e do inexplicável, tal como ocorre nas fábulas das Mil e uma noites.
Esses relatos extraordinários nos fazem crer protagonistas ou autores de algumas daquelas histórias - nossa mente revela-se na aparência de histórias banais, que nos inquietam misteriosa e aterradoramente. Essa, pois a essência desses contos que felizmente atravessam as cores do tempo. Os contos escolhidos são de autores como Honoré de Balzac, Walter Scott, Ernst Hoffmann, Nikolai Gogol, Edgar Allan Poe, Charles Dickens, Guy de Maupassant, Robert Stevenson, Henry James, Rudyard Kipling, entre outros. Ernst Hoffmann, em O Homem de Areia (Der Sandmann – 1817), nos impressiona. Mas antes ele nos adverte: “talvez, caro leitor, te convenças de que nada é mais fantástico e extraordinário que a vida real e de que o escritor não é capaz de apresentá-lo senão como um obscuro reflexo num espelho embaçado.” O Homem de Areia inspirou a obra de Offenbach e é referência num ensaio de Freud sobre “o estranho”. É um conto sobre o bicho papão - tão aludido pelas mães para sossegar seus filhos – um fantasma que habita nosso inconsciente e que pode se manifestar de forma bastante misteriosa. Mas trata-se, no entanto, dos conflitos interiores - que envolvem o homem e que podem assumir dimensões sombrias, o poder que está dentro de nós, que lhe damos formas e nomes, perpetuando-o sigilosamente. ‘Mas se tivermos firmeza e serenidade suficientes para reconhecer as influências externas adversas, tal como realmente são, e seguirmos tranqüilamente o caminho apontado pela nossa inclinação e vocação, esse misterioso poder está fadado a fracassar em sua lida inútil para chegar a forma que é o reflexo de nossa própria imagem (...) os conflitos que nos afligem são fantasmas de nossos próprio eu... cuja íntima ligação e cuja influência profunda sobre o nosso espírito nos precipitam no inferno ou nos alçam ao céu.” O homem de areia, o bicho papão, ou outro nome que lhe é dado, nos diz muito das fantasmagorias que nos tocam desprevenidos - aquilo que se vê, ou se projeta como realidade, enfim, o que pode provocar uma neblina, ou um estado de vigília, nessa guerrilha com imaginários seres que nos pertencem.
Contos fantásticos do século XIX, escolhidos por Italo Calvino, São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
uma crise virtual se apodera aqui ao som de Ali Dragon em meu computador. sabe um desses momentos paralisados buscando um ponto fixo para olhar? sabe aquela frase que é um filme de Spike Lee: "faça a coisa certa"? então, sem pessimismo ou temor, assumir as mudanças que se fazem necessárias. mesmo que a trama mental não permita ir além de divagações baratas nesse domingo de intenso calor, acalmado apenas por uma cerveja gelada... a verdade é que tenho os olhos cansados dessa tela. sei que há algo melhor que fazer, além dessas escrituras em código binário. uma outra liberdade, que faz falta nessa distância impessoal... o certo é que esse blog agoniza por falta de identidade. ele é amorfo, caótico. consciente disso, revelo a intenção de exercer meu micropoder (ah! Foucault!) de destruição... estancar sua inutilidade - em meio a tantas outras que suporta a grande rede mundial de computadores. um blog que soma-se aqueles de humor barato, ou de literatura de quinta. intenções de transgressões desqualificadas. atos semi-públicos. revelações privadas. fácil produto doméstico. contracultura anticultural. frivolidades intelectuais. reflexões sem esforço. estranho hobbie de busca da felicidade. enfim, compartilhar, como perfeitos católicos romanos, história e confidências. sim, somos livres consumistas de vícios insanos... reconheço que hoje foi uma tarde bacana, reconfortante, mesmo com o sol ardendo a quase 37 graus. mas há algo melhor a fazer... os fatos, as ações mais simples tem outras cores, outros nomes... o mundo se agita, melhor seguir esse pulsar, começando desde o movimento ordinário de uma rua.
jack nicholson em o iluminado, de stanley kubrick.
filme odiado por stephen king , mas um cult movie.
STEPHEN KING
O caderno Mais! (Folha de São Paulo) traduziu da “Paris Review” uma interessante entrevista com Stephen King. O escritor fala quais suas influências literárias: a ficção popular, como as HQs, o cinema e a vida cotidiana da classe média americana. Com mais de trinta adaptações de seus livros ao cinema e roteirizados para a telinha, King, mesmo que ignorado pelos que desprezam o terror como gênero literário, é um escritor respeitado em seu país. No cinema, suas referências principais são os filmes Carrie, a estranha (direção Brian de Palma), e O Iluminado (direção Stanley Kubrick). Sobre O Iluminado, King diz ter odiado a adaptação fria de Kubrick. E sobre o medo, ingrediente básico da literatura de terror, King dá sua fórmula: “Acho que não há nada de que eu não tenha medo, em algum nível. Mas do que nós, como humanos, temos medo? Do caos. Do "outsider". Temos medo das mudanças. Temos medo daquilo que perturba, e é isso o que me interessa.” E aquilo que perturba está presente no dia-a-dia das pessoas: “... quer você fale de fantasmas, vampiros ou criminosos de guerra nazistas que moram na nossa rua, estará falando da mesma coisa: a intrusão do extraordinário na vida ordinária e como a enfrentamos.”
JAZ ALICE COLTRANE
Alice Coltrane pianista de jazz, morre na última sexta-feira (12) aos 69 anos. Considerada uma lenda do jazz, viúva do saxofonista John Coltrane, Alice Coltrane fez parte do quarteto de seu marido a partir de 1960. Começou a estudar piano desde os sete anos, recebeu uma educação musical clássica, vindo a estudar jazz em Paris. Na década 1970 se converteu ao hinduismo fato que mudou sua vida e influenciou fortemente sua música. Tocou harpa em bandas de jazz e suas composições são responsáveis por lançar a chamada música New Age.
Em Paris ocorre o Salão do Cinema. O primeiro do gênero no mundo da sétima arte. Em que consiste esse salão: na verdade, uma grande exposição que parte da idéia que o cinema não se resume apenas ao espetáculo visto nas salas de projeções. Em torno de 50.000 pessoas passarão pelos 8.000 m2 do parque de exposição situado em Porte de Versailles (Hall 6). O público pode ver e participar de uma extensiva programação que inclui, entre outras coisas, palestras, mostras, projeções, cineclubismo, oficinas, os segredos de fabricação, simplesmente a magia do que ocorre por trás da tela. No salão, as pessoas podem ver, por exemplo, como Jean-Pierre Lelong realiza efeitos especiais sonoros de um filme de ação, ou Nils Tavernier rodando um curta metragem tendo o público como protagonista. Estão expostas as “story boards” em paralelo com as imagens dos filmes realizados. Ver também as reais proezas circenses de doublés que poupam os riscos dos atores dos filmes ou esbarrar com personagens dos desenhos animados preferidos das crianças; ou, ainda, ver parte do material utilizado por Sofia Coppola em sua recente obra fílmica sobre a rainha Maria Antonieta. Uma programação que dá vontade de participar.
después, sólo necesitas un esfuerzo para convertirlo en realidad.
Tai Lihua, bailarina do espetáculo My dream.
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Akira Kurosawa
Hoje revi o filme Sonhos(1990), de Akira Kurosawa. um filme que é um recorte poético das fantasias humanas. mas de sua realidade também: um olhar sobre a natureza, o amor, o ntendimento e o desentendimento entre os homens. Kurosawa sempre é preciso, mimético, detalhista, plástico. de seus oito episódios “o jardim dos pessegueiros” é o que mais me impressiona: o irmão mais novo de uma família, ao servir chá para as irmãs, depara com uma moça que foge. seguindo-a percebe ser ela uma boneca e logo vê os pessegueiros da sua casa totalmente cortados, restando somente tocos. os espíritos dos pessegueiros - incorporados num imperador e seus súditos - surgem em uma coreografia melancólica, e dançam para o menino ritmados pela música – inicialmente, sons tradicionais do Japão e no final sons mais contemporâneos, quase ocidentais. as cores do episódio, vermelho, verde, branco e rosa - são alternadas entre os planos da dança e os planos das árvores - e enchem a tela como uma pintura, a florada de um sonho que afeta o menino de alegria e contemplação. e nos emociona também.